segunda-feira, 12 de outubro de 2009

A ARTE DE TROCAR PIOLHOS

 
Acreditava que ter piolhos poderia ser algo socializante. Assim como uma tatuagem, um piercing, uma roupa estranha que distingue grupos sociais ou anti-sociais de jovens na “atualidade”. Mas os piolhos? Nunca os tive. Certamente até para eles minha cabeça era improdutiva. Isso, porque segundo lembranças, era comum algum adulto responsável perguntar: “_O que você tem nessa cabeça?”.
Quanto a essa pergunta, prefiro não discorrer, já que até hoje eu não sei a resposta (e a causa da minha apatia era fruto da busca).
Hoje, eu acho que sei que nenhum lugar é mais improvável de encontrar algo do que dentro de nossa própria cabeça. Ainda mais eu que possuía perguntas demais e idéias a que somente eu agregava realidade e pensamentos cujas crianças (que eu conhecia) normalmente não poderiam ter.
Meus pensamentos me causavam coceiras. Talvez tenham substituído psicologicamente a minha deficiência de piolhos.
Diria que descobri mais um foco de desigualdade infanto-juvenil na minha história pessoal. Se não foi me dado sequer o direito de compartilhar piolhos com meus colegas, imagina idéias! E, sim: eu me sentia discriminado por algo que estava além de mim e algo que eu não sabia o que era, mas que tornava as outras crianças nobres pela distinção de agregarem piolhos.
Na escola, havia uma prática difundida pelos professores de, vez em quando, juntar todos os alunos e verificarem se havia indícios de piolho em algum deles. Sempre havia, segundo a minha concepção, os sortudos que chamavam mais atenção mesmo que com um piolho morto ou uma lêndea seca . Uma vez, quase fui “condecorado” como novo membro dos alunos privilegiados cultivadores de piolho. Mas foi alarme falso. Eram apenas alguns grãos de areia em minha cabeça. Os anos escolares passaram e jamais um piolho foi encontrado em mim. Isso ainda me assusta. O que há em mim que afasta os piolhos e com isso a possibilidade de eu passar pelo rito, mesmo como retardatário, do processo artístico/tribal de catar piolho?
Aquelas crianças do passado deveriam ter algo na cabeça que possibilitava o cultivo em larga escala de piolhos. Talvez eles tenham tido no exterior da cabeça um terreno fértil para tal, enquanto meu terreno fértil era no interior da cabeça...
Meus piolhos intra-cranianos tinham um formato estranho. Eles eram quase exatamente assim, olha: “?”. E assim como os piolhos clássicos, eles também me sugavam. Aliás, o fazem até hoje.

Se acharem um desses na cabeça de alguma criança, ajudem a catar, mas não os matem. Apenas os ajude a se desprenderem

postscripitum: Texto sem correção ortográfica e sem razão existencial comprovada por argumentos sãos..

2 comentários:

  1. Eu fui uma criança piolhenta... e não tinha nota boas na escola.

    Isso te diz alguma coisa?

    =P

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  2. Me diz, sim. Me diz que você compartilhou coisas com outras crianças que eu nunca compartilhei. Isso porque na falta de afinidades, compartilha-se piolhos mesmo. Qualquer coisa que te desalienígene no mundo.

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